26 de agosto de 2009

Da série Ídolos

Cadê você, Belchior?

Deu em tudo que é noticiário: Belchior sumiu! Ninguém sabe de seu paradeiro.
Deixou casa, bens, carro estacionado numa vaga do shopping... e dívidas.
A última aparição, registrada por um câmera amador, foi no show do Tom Zé, em abril, na capital do País.
Eu fiquei mexida com essa história, tentando entender o que aconteceu.
Do que será que Belchior está fugindo? Ou atrás de que ele foi?
Fiquei triste... afinal, me embalei nas baladas que ele cantava nos anos 80.
Belchior é um compositor muito acima da média, com características próprias e letras profundas.
Fui dormir chateada, torcendo para que nada de ruim tenha acontecido com ele.
E sonhei... sonhei um lance muito real: eu, na casa de Belchior, numa ilha no meio do oceano Pacífico, de gravador em punho, fazendo uma entrevista para a matéria de capa de uma revista qualquer.

Por que você resolveu se isolar do mundo, sair do circuito desse jeito?
Belchior - Estou muito cansado do peso da minha cabeça, de todo esse tempo passado, presente, vivido entre o sonho e o som!

Mas foi escolher justo este lugar para se recolher?
Belchior - (sorri embaixo do vasto bigode ainda quase todo preto) Eu sei que qualquer canto é menor do que a vida de qualquer pessoa...

Mas isso foi de repente? Quando você se deu conta de sua vontade de sumir?
Belchior – No apartamento, oitavo andar (levanta-se e dramatiza com as mãos). Abro a vidraça e grito.... grito quando o carro passa: teu infinito sou eu!

Então você teve uma baita desilusão amorosa?
Belchior - O amor é a coisa mais profunda que um encontro casual. Deixando a profundidade de lado, eu quero é ficar colado à pele dela noite e dia. Viver a divina comédia humana onde nada é eterno.

E por que você fugiu? Por que não lutou por ela?
Belchior - Eu ainda sou bem moço pra tanta tristeza. Deixem de coisas, cuidemos da vida, senão chega a morte, ou coisa parecida, e nos arrasta, moço, sem ter visto a vida... ou coisa parecida...

Então, Belchior... você perdeu a esperança?
Belchior - Meu bem, o mundo inteiro está naquela estrada ali em frente (para e vira-se oferecendo o que está na bandeja sobre a mesinha) Tome um refrigerante, coma um cachorro-quente(e volta-se para continuar a entrevista). Sim, já é outra viagem, e meu coração selvagem tem essa pressa de viver.

E o que te impulsiona hoje? O que te anima?
Belchior - Você me pergunta pela minha paixão. Digo que estou encantado com uma nova invenção. Vou ficar nessa cidade, não!, não vou voltar pro sertão, pois vejo vir vindo no vento o cheiro da nova estação. E eu sei de tudo na ferida, viva, do meu coração.

Você sente alguma saudade do tempo em que fez um super sucesso?
Belchior - Quando eu não tinha o olhar lacrimoso que hoje eu trago e tenho; quando adoçava meu pranto e meu sono no bagaço da cana do engenho... (anima-se e mexe as mãos, com entusiasmo) eu era alegre como um rio, um bicho, um bando de pardais, como um galo - quando havia - , quando havia galos, noites e quintais (seu semblante fica novamente sério). Mas veio o tempo negro e, à força, fez comigo o mal que a força sempre faz. Não sou feliz, mas não sou mudo: hoje eu canto muito mais.

E mágoa, tristeza... depois de tanto tempo, você carrega algum desses sentimentos?
Belchior - Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo, tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais.

Uma homenagem singela a um dos meus compositores prediletos. Espero que ele esteja bem, vivendo algo muito especial, em algum canto mágico do mundo...