15 de junho de 2009

Da série As Voltas que a Vida Dá


DesEncontros


A primeira vez que os dois se viram era Primavera e chovia forte.
Protegiam-se sob o toldo de uma lanchonete.
Trocaram alguns olhares e frases bobas:
"Nossa! Que tempestade fora de hora!"
"Será que não vai passar nunca?"
"Parece que está diminuindo..."
Deram-se 'tchau' e cada um correu molhado pela vida afora.
A segunda vez foi no baile de formatura dele.
Quem diria! Tinham uma amiga em comum, que também se formara.
Dançaram a noite toda, riram-se e até rolou um beijo único.
Disseram-se 'até mais' e cada um rodou pela vida como em uma valsa.
No ano seguinte, era Carnaval num clube da cidade.
Surpreenderam-se com o terceiro encontro, no meio do salão.
Coincidência: ambos ganharam entradas para o baile, numa loja de departamentos,
porque compraram mais de 100 reais em mercadorias.
Fingiram-se Colombina e Pierrô, quanto riso, quanta alegria, até a madrugada.
E foi com um beijo longo, um amasso atrás da porta, que se disseram 'nos vemos, então',
e pularam cada um a sua vida, como uma marchinha.
O quarto encontro aconteceu dez anos depois, no velório daquela tal amiga comum.
Choraram juntos perto do caixão, se abraçaram forte, e assim disseram 'adeus',
cada um descendo a ladeira como em uma procissão fúnebre.
Seis anos mais tarde, o quinto encontro foi, na verdade, um desencontro:
ela entrando no cartório para selar seu casamento civil. Ele saindo... divorciado.
Tocaram-se as mãos, que disseram um 'até qualquer dia',
e cada um seguiu como pôde: ela em lua-de-mel, ele no mundo da Lua.
O sexto encontro foi algum tempo depois, quando ela foi buscar o filho
na festa de 15 anos de uma amiga, que era filha dele e amiga da namorada do filho dela.
Viram-se e sorriram-se emocionados... há quanto tempo...
Cumprimentaram-se e se despediram com três beijos na face, um após outro.
E cada um apenas prosseguiu, como fazem os pais para viverem por seus filhos.
Do último encontro, nem se aperceberam.
Quem viu foi a nora dela, quando levaram flores em seu túmulo.
Ao lado, estava o jazigo dele, que havia falecido dois anos antes.
Ela encontrou com ele quando tropeçou na nuvem em que ele descansava.
Cairam os dois a gargalhar pelo delicioso destino.
E assim seguiram juntos, pela primeira vez, com as almas entrelaçadas,
num encontro eterno, que a morte uniu... e nunca mais os separe.

14 de junho de 2009

Da série A Cor do Pecado


Gula
--Oi, tudo bem?
-- Não... nada bem!
-- O que foi?
-- Está faltando um pedaço aqui.
-- Ah, isso? É que senti fome ontem à noite...
-- Mas era meu! Você não tinha esse direito!
-- Amor, desculpa... não aguentei o ronco da minha barriga, poxa!
-- Eu jamais faria isso com você, nem com a maior anemia do mundo!
-- Sei. Já pedi perdão. Tá feito!
-- Espero que isso não se repita!
-- Não vai se repetir! Agora tira esse bico da cara e vamos para outro lugar!
-- Para onde?
-- No lixão lá de cima tem carniça nova! Venha!
E voaram lado a lado.


Luxúria
-- Eram três mulheres, cara! Acredita?
-- Três? Mas que danado!
-- Uma loira, uma mulata e uma morena de cair o queixo... ali, nuas, com ele...
-- Mas aos 82 anos, me parece exagero. Por isso deu no que deu. Nem eu, com quase quarenta, daria conta...
-- Mas você não ficou sabendo?
-- Sabendo o quê?
-- Do bilhete que ele deixou... foi suicídio...


Avareza
-- Eu estou p... da vida! Nunca, nunca mais dou esmolas!
-- Por quê? O que houve?
-- Sabe aquele sujeito que anda mal vestido pra cima e pra baixo, com cães vira-lata à volta,pedindo esmola na rua? Aquele sujo, magro e descabelado?
-- Sim... sei... ele anda por aqui há anos.
-- Pois então... dia desses fui fazer entrega no bairro dos bacanas. E vi esse aí entrando numa mansão!
-- Sério?
-- Sim... e fiquei lá, meio escondido, para ver se ele saia.
-- E aí?
-- Aí que duas horas depois o cara saiu numa estica, dirigindo um BMW.
-- Nossa!
-- Fui atrás dele, na maior dificuldade, com minha kombi. O cara parou num restaurante super e uma mulher toda chique o esperava na entrada. Fiquei muito, muito bravo!
-- E depois?
-- Dei um rolê e comprei um sanduba numa barraquinha. Voltei para lá esperando ele sair.
-- Que coragem!
-- Claro! O cara me fez de idiota por anos! Daí ele saiu com a tal.
-- E você?
-- Eu cheguei junto, segurei no ombro dele e falei: "Peraí, mano!"
-- E o que ele fez?
-- Me olhou de cima a baixo, tirou uma nota de 100 da carteira e enfiou no bolso da minha camisa... desgraçado!


Mentira
-- Cheguei tarde porque tive reunião! Já expliquei! E te falei que teria essa reunião longa. Eu sempre aviso!
-- Uma reunião sem celular ou qualquer telefone disponível?
-- Isso mesmo! Era algo complicado, desligamos tudo. Para não sermos interrompidos.
-- Fico imaginando que assunto tão secreto poderia ser discutido numa reunião de vendedores de enciclopédias!
-- Olha... eu estou cansado desse seu ciúme bobo! Terei outra reunião dessas amanhã e só de imaginar que quando chegar em casa vai ser essa chatice... dá vontade de não voltar!
-- E você acha que eu não devo ficar insegura? Cada vez é uma desculpa mais esfarrapada do que a outra!
-- Você vê assim porque é doida! Ou confia em mim ou paramos por aqui.
-- O que você quer dizer?
-- Quero dizer que desse jeito não dá! Acredita em mim ou a gente termina agora!
-- Mas eu te amo!
-- Ama, mas não confia!
-- Tá... estou estressada, sei lá... vou tentar maneirar... prometo...
-- Então, pazes?
-- Pazes...
-- Beijo?
-- Beijo...
-- Tá certo, querida. Vou até a padaria comprar pão e cigarro e volto logo, tá bom?
-- Tá... te espero... não demora...
Ele saiu e ela foi ligar para a amante: "Amanhã ele terá outra reunião daquelas! Te encontro no mesmo lugar..."

Da série Eróticos Urbanos - parte 2(a primeira parte desta série você pode ler na publicação do dia 7 de junho )

Very pretty

Morava com a tia, que a acolheu quando chegou do interior.
Cuidava das primas menores e, uma vez por semana, ficava sozinha,
podendo assistir aos filmes que quisesse, no videocassete da sala.
Um dia, por acaso, colocou lá uma história pela qual se apaixonou.
Naquela vez - só naquela vez - assistiu seis vezes seguidas.
Ela se via nos cabelos lisos, na boca carnuda e no corpo alto e esbelto da mocinha.
Ela viu seu homem, que um dia iria buscá-la, naquele grisalho, de olhos amendoados e sorriso meigo.
Sim! Esta também seria a história de sua vida, cheia de dor, mas de muito amor e final feliz.
Por isso decidiu seguir os passos da protagonista. Deixou a tia e foi ganhar a vida... na vida.
Começou de baixo, recebendo qualquer trocado, mas logo tornou-se a super do pedaço,
conhecida pelas colegas e pelos clientes como 'Pririuoman'.
Também passou a escolher quem atenderia: só grisalhos quarentões.
Fazia de tudo do melhor jeito, no capricho, e em troca queria presentes, motéis refinados, champagne...
De um dos clientes mais fiéis, ganhou o videocassete e a fita do filme,
que ela revia todas as manhãs, quando voltava da labuta, antes do merecido sono.
Já sabia os diálogos de cor, fazia as caras e bocas da mocinha e sonhava-se transando loucamente com o grisalhão.
Em uma noite fria, na esquina de sempre, de casaco branco de pele, ela viu um carrão preto aproximar-se.
Era aqueles grandes, de casamento, com chofer e tudo.
Este desceu do carro e entregou-lhe um envelope vermelho.
Dentro havia um bilhete que ela não entendeu, mas que o chofer leu em voz alta:
"Ai ueiti for iu. Ai nidi iu. Plis, dont sei nou!"
Ela ficou zonza, achou que ia desmaiar. Era ele? Será que, finalmente, era ele?
Conduzida pelo chofer, entrou na limousine, onde champagne e flores a esperavam.
Rodaram ruas e avenidas até que chegaram a uma linda mansão.
Na porta, um mordomo a esperava e a levou a um quarto que dava uns dez do seu, que dividia com duas amigas.
Ela ficou paralisada fente àquela maravilha, cores, flores, tapetes, móveis...
E sentiu a presença de alguém atrás de si...virou-se... meu Deus!!!! Era ele.
Ele mesmo! Os olhos amendoados, o sorriso meigo, a boca pedindo para ser beijada.
Ela não conseguiu se segurar: deixou o casaco cair, mostrando seu conjunto rendado e vermelho e o fio dental comendo-lhe a bunda, toda bela em cima das sandálias plataforma, também vermelhas.
Ele veio ao seu encontro, abraçou-a ternamente e beijou-a primeiro na testa.
Depois, na ponta do nariz, no queixo... e ela, ela que estava ansiosa e louca de tesão,
agarrou-o pela nuca e meteu-lhe um beijo na boca, explorando-a com sua língua cheia de desejo.
Ele retribuiu e começou a acariciá-la, levando-a para a cama king size tripla master plus, onde ela se deitou.
O mocinho tirou as sandálias e começou a beijá-la nas pontas dos dedos dos pés.
Subiu pelas pernas, chupou-lhe as coxas e ficou minutos seguidos nutrindo-se do sexo dela,
que gemia e sentia aquilo que nunca sentiu nos três anos de rua e de grisalhos sem fim.
Depois, ele lambeu seu ventre flácido e chegou aos peitos, deixando ainda mais duros os bicos negros, com os quais brincava fazendo círculos em volta, com a língua insistente.
Ele levantou-se para tirar a camiseta e a calça e, estrategicamente, sem cueca, deixou seu sexo duro exibir-se para ela.
Priri não sabia mais o que fazer e puxou-o contra ela.
Foi quando aquele olhar meigo e sorriso terno tornaram-se intensos e ele a penetrou com tudo o que tinha direito.
Ela o olhava enquanto o movimento de ir e vir tomava conta do silêncio,
e lágrimas de alegria caiam em suas faces cheias de pó-de-arroz.
Nesse encontro de coxas - enquanto as mãos dela apertavam as costas lisas e encantadores dele -veio o gozo mútuo e longo, seguido de um gemido contínuo de seu homem, relaxado sobre ela.
Ele deitou-se de costas e puxou-a para que descansasse em seu peito.
Esticou a mão ao criado-mudo e pegou uma rosa vermelha, que colocou nos cabelos dela, enquanto a beijava ternamente.
Ela deixou-se ficar ali, sem pressa, sem medo, sem querer porquês.
E acordou em sua cama, no quartinho apertado, vestida com o casaco de pele e as sandálias vermelhas.
O filme, no video, já mostrava os letreiros.
Ela quase se pôs a chorar de tristeza por acordar do sonho e saber que jamais seria, de fato,
a Pririuoman, nunca teria ao seu lado o grisalho gostoso, gentil e viril a fazer-lhe as vontades...
Mas segurou as lágrimas quando se olhou no espelho e viu a rosa ainda presa em seus cabelos.