19 de novembro de 2010

Da série Serviços

Não é bem uma Brastemp...

Os casamentos, dizem, entram em  crise aos 7 anos.
E os eletrodomésticos aos 5. Li isso em algum lugar ou acabei de inventar. Sei lá... mas que minha geladeira Brastemp está numa má fase, ah, isso está!
Há três meses, sem qualquer aviso, ela começou a piscar e berrar sem dó. Todo o painel se acende e o 'pipipipi...' me acorda de madrugada ou me tira da frente da TV. Às vezes, chego em casa e ela está agonizando. O 'pipipi...' já fraquinho e as luzes enlouquecidas: vermelho, verde, vermelho, verde... Lembro do robô doidão de Perdidos no Espaço: "Não tem registro! Não tem registro!" (quem tem menos de 40 anos nem sabe do que tô falando...).
Um imã de geladeira, que fica na porta da própria, mostra o fone do atendimento Brastemp.
Ligo lá (isso há três meses) e, cordialmente, pedem as informações, agendam a visita e eu fico no aguardo.
Aviso que posso às quintas, porque é quando minha auxiliar - que mantém minha casa um brinco - está lá, das 9 às 15h. "Pode deixar! Vou anotar aqui no protocolo o horário", responde prontamente a atendente X.
Só que no dia agendado, minha auxiliar me liga às 16h para contar que até então nada do técnico. Então eu ligo lá, no pronto atendimento Brastemp, falo com Y e ela me diz que no protocolo está escrito "horário comercial". Eu teimo. Ela teima e ficamos nessa teimosia besta. Ela me diz que vai ligar para o técnico e pedir um posicionamento... boa... nada como um posicionamento para acalmar qualquer dona de Brastemp. Nisso a minha auxiliar liga pra avisar que o fulano técnico está lá, o seu Mané.
E tudo caminha bem, até eu chegar em casa. Vejo a nota fiscal. Quase 400 paus entre peças (de descongelamento automático) e mão-de-obra. O que a gente não faz por uma Brastemp, não é mesmo?
Tem um bilhete escrito pela minha auxiliar: "Mari, o seu Mané disse que a geladeira tinha de estar desligada pra ele fazer o serviço. E como não estava, falou que tem de ficar hoje a noite toda e só ligar amanhã". Não dei muita bola até me lembrar que na geladeira havia comida altamente perecível. Que acabei jogando fora no dia seguinte, com medo de consumi-la e pagar o maior pau!
Os dias se passaram... eu olhava feliz para a minha Brastemp, pensando comigo mesma: "Superamos essa crise, companheira!".
Três semanas depois, no meio da noite, sonho que uma sirene se aproxima da porta de minha casa. Vou olhar pela janela e não vejo nada. Acordo e percebo que a sirene, na verdade, é minha Brastemp apitando...piscando...berrando!!!!
Desligo a coitada e depois de um tempo ligo de novo. Silêncio total. Que dura só até meu retorno ao lar, à noite. Ela voltou a berrar e iluminar-se sem fim.
Outra vez, ligo para a assistência técnica...outra vez tudo se repete, mas fui esperta! Desliguei a geladeira na noite anterior à vinda do técnico. Que, pasmem!, é o mesmo sr. Mané. Desta vez ele não chegou tão tarde.
E a vida continua... até que, no meio do Jornal Nacional, ela volta a apitar.
Aí, amigos, eu já me irritei total! A sorte é que tudo está na garantia. O azar é que, ao ligar para a assistência técnica e relatar tudo de novo, pedindo, pelamordedeus, que mandem outro técnico, o simpático mocinho confessa que, na minha região, só tem essa assistência autorizada... e suplica: "Vamos dar mais uma chance para ele, dona Mariângela". Nessas horas, minha formação cristã baixa com tudo e respondo: "Amém!!!"
No dia marcado, seu Mané apareceu às 17h55 e minha auxiliar, que mora pra lá do lá, tinha me ligado às 17h, pedindo pra ir embora porque a vida dela não é uma Brastemp e ela teria de fazer o seu segundo turno de trabalho. Ela se foi e seu Mané bateu o nariz na porta. E eu de novo perdi comida na geladeira desligada. Reagendei a visita. E a geladeira agonizando, todos os dias, pedindo-me socorro!
Ontem foi o dia do retorno dos que não foram. O dia que o seu Mané ia em casa.
Temendo que ele chegasse tarde e atrapalhasse a vida de minha auxiliar, pedi a minha mãe que fosse pra casa depois do almoço. A assitência técnica me ligou às 17h para avisar que o técnico daria uma atrasadinha. Se para mim tudo bem. Liguei pra mãe que concordou em esperar mais um pouco. Deu 19h, esta me liga: "Nada do seu Mané, filha". E eu, mais q p.. da vida com o Mané, falei pra ela desencanar e ir embora. Logo em seguida, mamãe me retorna dizendo que cruzou com seu Mané na portaria e já estava em casa de novo. "Só que ele disse que não pode fazer o serviço porque você deixou a geladeira desligada..." Meu sangue subiu tanto nessa hora que senti tudo vermelho. O coração acelerou e eu comecei a suar. "Deixa eu falar com ele, mãe!"
Vem o seu Mané na linha: "Pois não, dona Mariângela" . E aí mandei meu lado cristão pras cucuias. Disse tudo e mais um pouco, mantendo a educação que me foi dada, mas disse. "Seu Mané, o senhor falou que era pra deixar desligada. Ficou brabo uma vez que eu não deixei...". Ele: "Dona, mas é que era outra peça. Agora será outra que preciso ver quando está ligada". Eu: "Mas, seu Mané, quantas peças o senhor vai trocar pra ajustar a geladeira? Vai trocar ela inteira? Por que o senhor não admite que não sabe o que é e manda outro Mané pra fazer o serviço?" Ele: "Eu sei o que é e quero resolver!". Eu: "Já marcamos isso várias vezes. Tô perdendo comida, logo vou perder minha auxiliar e minha mãe vai me deserdar... o senhor não cumpre nada, nem horário, seu Mané!". Ele: "Prometo pra senhora que, na quinta que vem, chego entre 9 e 12h e conserto sua geladeira!". Respiro fundo, penso na família do seu Mané, no quanto pra ele deve ser complicado não saber resolver um problema, e respondo:"Tudo bem. Mas será a sua última chance".
E até lá, meus amigos, tenho de convencer a minha Brastemp a segurar as pontas, a aguentar firme por mais alguns dias... essa, sim, será a mais difícil tarefa.

18 de novembro de 2010

Da série Pressa

Imediatamente já

Já tem gente armando a árvore de Natal...
Por que será que as pessoas têm tanta pressa pra que o ano acabe?
Gente! Pare e pense: quanto mais rápido, mais velho!
Eu prefiro ir devagar... sorver cada segundo durante uma hora inteira!
Tô na Páscoa ainda. Tenho ovos que nem abri. Amanhã desembalo mais um. Faço aquela cara de "o que será que tem dentro?"
Abro e curto cada pedacinho do chocolate perfeito - porque não existe chocolate imperfeito.
Então, parem de querer me vender panetone! Não estou a fim de comprar a tele-sena de Natal.
Deixem-me viver um dia após o outro, de-va-ga-ri-nho.
Pra que essa angústia toda, hein? Hein?
Porque o Natal vem, quando tiver de vir. Nem um dia a mais, nem a menos.
E depois dele? Qual será a próxima urgência? O Ano Novo? O Carnaval?
Cara! Me deixa, porque ainda tô na Páscoa...


Sem tempo

Ela ficou grávida. Não estava nos planos, mas já que veio... vamos em frente!
O problema é que ela não tinha qualquer paciência. Nove meses é tempo demais, pessoas!
Pra ela era uma eternidade que ia aumentando conforme o tamanho e o peso da barriga.
Lá pelo quarto mês (vejam como era impaciente a menina!) ela se irritou de vez.
Decidiu que faria algo para acelerar esse processo e ter o filho (ou filha - ela ainda não sabia) antes dos 9 meses.
Mas, claro, perfeitinho, no tamanho normal e sem qualquer complicação.
Pesquisou tudo o que conseguiu sobre aceleração do tempo, assistiu 10 vezes o filme que o cara vai pro passado, pro futuro e não para nessa loucura de ir e vir, leu artigos científicos e tudo o mais.
Daí que só nisso foram três meses. Assim, no sétimo mês, ela estava sentadinha numa sala maluca, esperando um cientista super doido, indicado pela prima da vizinha da tia avó da melhor amiga da cunhada dela.
Sabia-se que o tal era um gênio, mas se tinha feito alguma descoberta sobre acelerar o tempo, ninguém nem imaginava.
Mas não custava tentar. E foi isso que ela fez. E por isso estava lá, naquele lugar esquisito, cheio de ferramentas, máquinas, jornal velho e cheiro de mijo.
De repente, a porta abriu-se e surgiu o cientista, mais pra professor Pardal do que qualquer personagem das séries de aventuras interplanetárias que passam na TV.
Mas ele tinha carisma. Ou, talvez, a moça apressada era muito babaca mesmo. Só sei que ele a convenceu de que era possível, sim, acelerar o tempo.
Bastava sentar na cadeira temporal, atrás do biombo e ao lado da privada, conectar-se aos fios e outros ganchos estranhos que ali se penduravam e fechar os olhos para esperar... esperar o que mesmo? Ah, sim... que, ao ligar o botão do tempo, a viagem começasse.
Porém.... claro que tudo tem um porém.... ele não podia afirmar que a aceleração seria exatamente os 2 meses que ela queria saltar da gravidez. Podia ser mais ou podia ser menos.
Mas quem não vive de risco? E a doida topou.
Sentou-se na cadeira, deixou-se amarrar e conectar tudo o que tinha direito. Fechou os olhos e esperou o cientista gritar: 'Já!'.
Esperou, esperou... abriu um olho, abriu o outro... e o cientista lá, parado, de costas, na frente de um painel todo luminoso. Ficou quieta e fez força, fechando os olhos para concentrar-se.
Foi aí, nesse exato momento, que ela sentiu que tudo estava molhado.
Caramba! Será que ela foi parar no meio do mar?
Que nada, tontinha! Foi a bolsa que estourou.
Felizmente, mesmo doidão, o cientista era rápido para tomar as devidas providências.
Levou a grávida, em trabalho de parto, no 7º mês, para a maternidade mais próxima.
Blade Runner (ela gostou do nome quando viu o filme, durante suas pesquisas sobre futuro) nasceu pré-maturo, mas super saudável. Quase 3 quilos. Loirinho como o pai. Ficou um mês no berçário.
A mãe doidinha ia e vinha do hospital para dar de mamar ao seu pequeno viajante do tempo.
O cientista acabou aceitando ser o padrinho de batismo.
E a vida continuou igual no Planeta Terra. Só começou a querer bagunçar de novo quando a mãe doidinha resolveu que o filho ia pular a fase escolar pra ir direto à faculdade.
Felizmente, o padrinho cientista, sabendo dos devaneios da moçoila, manteve uma placa de "volto logo" pendurada na porta de seu laboratório. Reza a lenda que, pelo estado da cadeira temporal, a viagem do cara foi pra bem longe... tô achando até que esse aí não volta mais.