13 de abril de 2010

Da série Amadurecendo

Magia

No livro de minha vida não tinha páginas em branco.
Pensava: "preencho de 'nada a ver' mas não as deixo vazias".
Fiz isso sempre. Não sabia ficar calada nem em total sossego.
O sossego me desassossegava e sentia-me estranha se pouco fazia.
Mas aprendi que o excesso cansa - não só as pernas envelhecidas, mas a alma que gosta de se balançar na rede, presa ao destino, à espera.
Muitas coisas mudaram. Muitas. Até a caligrafia - que marcou no meu livro cada evento e descoberta - é outra.
Mais para garrancho do que para o arredondado das palavras. Não por pressa, mas por achar que o muito certo tem sempre algo de errado ao fim.
Comecei registrando detalhes. Do choro rompido, quando deixei o aconchego do ventre de minha mãe, ao choro interrompido de meu filho, ao sair de mim.
Daí em diante, acho que parei de fixar todo e qualquer movimento meu e do girar mundano.
Inconscientemente eu acreditava que dominava tudo. Inconscientemente fui perdendo a ilusão desse poder.
Culpa da vida que fluia sem certezas, acompanhando o engatinhar, o andar, o falar de meu filho e a minha maturidade tardia que percebeu muito depois que não sou deus de mim mesma nem de ninguém.
A fluidez matou meu desejo de controle. Porque me peguei balançando na rede, junto à alma, presa ao destino.
Um ir e vir de tamanha paz que a vida continuou e eu me percebi aqui, depois de tantas páginas viradas.
No contar do tempo, remocei. Voltei a acreditar no amor, na entrega e na verdade.
Chorei fora do ventre, eu sei, mas com tanta ânsia de viver que... nem sei.
E as vírgulas que tanto marcaram minha existência não querem mais pausar esse destino, o mesmo em que minha alma descansa, balançando-se.
As páginas continuam cheias, mas com alguns vazios.
Não mais faço ou digo tolices apenas para preencher-me. Se preciso for, terei silêncios. Bons e calmos, brancos e ternos.
Ou azuis e intensos, da cor dos olhos de quem caminha comigo.